Situações aconteciam de improviso, como um dia em que eu acabara de chegar no terreiro, quando vieram me chamar depressa que uma criança estava para nascer. Não havia tempo de levar aquela mãe ao hospital e ali mesmo, fiz o parto, como havia aprendido com o veterinário a cuidar dos porcos, que eram tratados como gente. Conversávamos bastante e ele me explicava como era na linha humana, então me atrevi a colocar aquela criança no mundo.
Assim que tudo estava feito e a mãe com o bebê no colo, coloquei todos no carro e rumei para o hospital para ver se estava tudo certo. Recebi elogios dos médicos e me animei.
Depois desse intento, passei a ser tudo para eles e até ordem nas casas,quando havia uma briga de casal que chegasse ao extremo de pancadaria, eu corria a atender e pregar um bom sermão no marido, ameaçando se acontecesse outra vez e o respeito foi se instalando.
Certa vez, fui acudir uma criança com fortes dores de cabeça e já tendo convulsões, corri com ela para o hospital e quando a peguei no colo para entregar ao médico, eram seus últimos instantes de vida. Foi muito triste e eu me lembrava do meu filhinho que se fora também. Abracei aquela mãe e lhe dei todo o carinho que pude.
Tínhamos um enorme canavial e grandes pastos, onde a mão de obra era usada e muito comum aparecer alguém mordido de cobra. Quando isso acontecia, eu aplicava o soro ati ofídico e corria com a pessoa para o hospital. Machucados, eu mesma tratava e todos tinham a maior confiança em mim.
Algumas vezes eu reunia todos, tocava acordeon, eles cantavam, contavam causos e a vida ia seguindo.
Dois anos mais tarde, nasceu minha filha, para alegrar meu coração de novo. Embora eu quase não tivesse sobrevivido ao parto, voltei pra casa com minha filhinha nos braços e uma nova esperança na vida.
A lagoa grande, nos fundos da casa, tinha um barquinho a remo que eu usava para ir do outro lado da margem, visitar um velho amigo que era tomador de conta de uma fazenda vizinha. Sr. Tião, como todos o conheciam, já idoso, mas muito disposto e gostava de uma boa prosa. Vinha nos visitar e sempre trazendo algum agrado, eu fazia uma broa de fubá e conversávamos bastante. Quando íamos visita-lo, eu e as crianças usávamos o barquinho e levávamos bolo para ele.
Era uma alma boa, vivia sozinho ali, quando fazíamos algumas festinhas no sítio ele era o convidado especial. No Natal, usava uma roupa de Papai Noel que eu mesma fizera para ele e um saco cheio de presentes, balas, biscoitos, brinquedos, tudo o que ele pudesse carregar e ele saí pela estrada a visitar os pequenos sitiantes, chegando quase a noitinha para me contar por onde tinha andado. Era muito bom saber que certas crianças no meio do mato só tinham aquele Papai Noel que todo ano era esperado.
Eu me dediquei de corpo e alma a minha nova atividade. Procurei assistência para conhecer melhor sobre meus empreendimentos, fiz cursos para saber administrar e participava de congressos sobre avicultura, suinocultura, feiras e exposições agropecuárias, onde tinha o orgulho de ganhar prêmios.
Apesar de todo o progresso, das pessoas que me cercavam, das atividades do sítio, minha vida no lar era um desastre e quando minha filha nasceu e eu soube que não teria mais filhos, não deu mais para suportar e acabei me separando e ficando só com meus filhos.